Nísia: ‘Perdemos a alta cobertura vacinal que já era normalizada’

Maio/2023

Vivian Mannheimer e Marina Lemle | Blog da revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos

A ministra da Saúde Nísia Trindade Lima e o novo presidente da Fiocruz, Mario Moreira, em sua cerimônia de posse. Foto: Peter Illiciev/Fiocruz

Há 20 anos, em 2003, em comemoração aos 30 anos do Programa Nacional de Imunizações (PNI), criado em 1973, a revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos lançava um suplemento sobre imunização no Brasil. A ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima, socióloga e pesquisadora de história da saúde, foi uma das editoras deste número especial, junto com os pesquisadores Nara Azevedo, Carlos Fidelis Ponte e Akira Homma. Em visita ao Rio de Janeiro para a posse do novo presidente da Fiocruz, Mario Moreira, na sexta-feira, 12 de maio, a ministra, ex-presidente da Fiocruz e ex-diretora da Casa de Oswaldo Cruz, conversou com jornalistas.

O Blog de HCS – Manguinhos perguntou quais foram os principais marcos históricos, entre avanços e retrocessos, nestes 50 anos do PNI.

“O Programa Nacional de Imunizações, como você disse, completa 50 anos. São 50 anos de muito êxito e nos últimos, principalmente nos últimos quatro anos, de grande preocupação, porque perdemos a alta cobertura vacinal de vacinas que já eram uma parte mais do que normalizada. Ou seja, não era um problema. Todas as famílias levavam as suas crianças pra vacinar pra pólio, para vacinar pra sarampo, rubéola, enfim… Era uma prática, mas essa prática não vem do nada. Então é importante olhar essa história sim.

Foi através do PNI que conseguimos erradicar a varíola. É a única doença prevenível com vacina que podemos dizer que foi erradicada. Ou seja, não tem circulação do vírus em nenhuma região. Isso foi um grande feito. Conseguimos sucesso ainda na década de 70 com relação à meningite, à pólio, como falei, que foi eliminada da região das Américas e, infelizmente, voltou.

Isso tudo são alertas para que nós façamos um Movimento Nacional, como definimos no ministério da Saúde, envolvendo todos os níveis de governo e a sociedade em uma campanha, e mais do que campanha, num movimento mesmo para recuperar essas coberturas. É nesse processo que nós estamos. Sabemos que a reversão não será rápida porque houve muita campanha contra a vacina e também muitas mudanças na sociedade, doenças que deixaram de ser vistas como ameaça não geram aquela visão de que é preciso nos proteger. Nós não podemos ter uma atitude passiva. Estamos montando muitas estratégias de busca ativa, envolvendo as escolas, envolvendo festas populares, envolvendo todas as ações em todas as áreas de governo, não fazendo da vacina um evento só da saúde”, respondeu a ministra.

Perguntada na entrevista coletiva se as campanhas precisam combater as fake news, Nísia Trindade lembrou que existem estudos já sistematizados sobre as fake news – notícias falsas e criminosas que devem ser combatidas. Ela lamentou que muitas vezes as fake news sejam propagadas por médicos, que ferem assim o código de ética, falando de mortes por vacina e alegando pesquisas que não têm nenhuma base.

“Esse movimento tem que ser feito não só com ações de comunicação, mas também com investigações daquilo que se verifica como crime. Daí temos o projeto de lei voltado pra isso (PL2630) e a saúde é um dos casos, a vacina é um dos casos que precisa ser visto com muita atenção. Mas não é só essa a razão. Sabemos que é importante uma busca ativa, porque muitas vezes não se vê mais aquelas doenças que eu quando criança sabia que eram uma ameaça. Tive colegas na escola com sequelas de poliomielite. Então como tivemos avanços, vitórias, isso parece coisa do passado. Não é. Infelizmente não é. Então precisamos passar essa consciência à sociedade. Além disso, ampliar a oferta, os horários de vacinação, os locais de vacinação, encarar a questão como o problema que se tornou. Não pode mais ser vista só pelo lado da rotina, ainda que nós tenhamos que investir nas melhores rotinas nas nossas unidades de saúde. Estamos também em diálogo com os agentes comunitários de saúde, porque eles têm um papel fundamental indo até as famílias, as casas, e ajudando nesse processo. Terá que ser uma grande mobilização nacional”, disse a ministra.

Nísia Trindade Lima foi homenageada na Carta do Editor do atual número de HCS-Manguinhos (vol. 30, 2023) pelo editor-científico da revista, Marcos Cueto.

“O final de 2022 trouxe um acontecimento que nos traz otimismo: a designação de Nísia Trindade Lima como ministra da Saúde. A partir de janeiro de 2023, ela é a primeira mulher a comandar o órgão federal, criado em 1953, cujos 50 predecessores foram homens”, ressalta o editor, e completa: “A confiança em sua gestão não advém do fato de ser mulher. Confirma que cientistas sociais e historiadores podem contribuir com seus estudos para as políticas públicas de saúde e para o Sistema Único de Saúde (SUS). Conhecemos sua capacidade intelectual porque a maioria de suas pesquisas e publicações se situa no campo da história da saúde.” Segundo Cueto, a notável trajetória fornece a Nísia “as melhores credenciais para enfrentar novos desafios, graças a sua capacidade de articular diálogos intersetoriais frutíferos entre ciência, sociedade civil, política nacional e saúde global”.

Leia na revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos:

Nísia Trindade Lima: orgulho da Fiocruz, orgulho do Brasil, Carta do Editor, Marcos Cueto (HCS-Manguinhos, n. 30, 2023).

Leia mais no Blog de HCS-Manguinhos:

A volta do Brasil da vacinação

Movimento Nacional pela Vacinação busca a retomada das altas coberturas vacinais e da confiança da população brasileira nas vacinas, com destaque para a volta do Zé Gotinha como símbolo da campanha!
Há 20 anos, a atual ministra da Saúde Nísia Trindade Lima co-editava um número especial de HCS-Manguinhos sobre a história da imunização no Brasil.
Confira o suplemento (v. 10, supl. 2, 2023) e muitos outros textos sobre vacinas e vacinação publicados na revista ao longo de décadas.

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Ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima apresenta Aula Inaugural da Fiocruz 2023

Assista a aula inaugural de 2023 da Ministra Nisia na Fiocruz em 31 me março de 2023: