Preconceito racial contra chineses no Peru diminuiu na pandemia

Agosto/2022

A pandemia do coronavírus expôs uma tendência mundial ao longo da história de culpar imigrantes pela propagação de epidemias. No Peru, os chineses sofreram preconceito racial durante crises de saúde pública anteriores, como as epidemias de febre amarela e peste bubônica, mas, surpreendentemente, a ideia de que os descendentes de chineses seriam “agentes de contágio” diminuiu significativamente durante a atual pandemia.

A peste amarela (Fray K-Bezón, n.91, p.5, out/1908). Charge reproduzida no artigo.

No artigo Covid-19, a diáspora chinesa e o legado duradouro do racismo no Peru, publicado na revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos (vol. 29, n. 2, abr/jun 2022), José Ragas, professor do Instituto de Historia da Pontificia Universidad Católica de Chile, e Patricia Palma, professora do Departamento de Ciencias Históricas y Geográficas da Universidad de Tarapacá, Arica, Chile, examinaram três grandes epidemias (febre amarela, peste bubônica e covid-19), a fim de demonstrar a atual mudança nas atitudes negativas em relação à comunidade chinesa.

“A recusa dos peruanos de adotar termos depreciativos, como o ‘vírus chinês’, ou visar indivíduos de ascendência asiática é algo intrigante em tempos de completa disseminação de discurso xenofóbico no hemisfério ocidental”, afirmam os autores. Eles enfatizam o modo como a opinião pública moldou as políticas que exigiam o deslocamento forçado e a expulsão de imigrantes chineses entre 1860 e 1910 e salientam os fatores de longo prazo que ajudaram a cessar as atitudes hostis dirigidas às comunidades estrangeiras e grupos minoritários.

“Em tempos como os de hoje, quando o nativismo e o populismo nacionalista crescem em popularidade, a imigração é um fator crucial no repertório de políticas destinadas à contenção e à compreensão de uma pandemia como a de covid-19. Os imigrantes foram reiteradamente, ao longo da história, apontados como bodes expiatórios dos problemas das sociedades. Contudo, as forças geopolíticas e sociais que determinam essa postura não são imutáveis e estão em constante transformação, como confirma a experiência imigratória dos chineses peruanos”, afirmam. Eles acrescentam que, ao contrário, “a comunidade chinesa deixou de ser alvo da mídia e da população local, e a China passou a figurar como aliada global em matéria de saúde pública.”

Por outro lado, o historiador Marcos Cueto, editor de HCS-Manguinhos, citado no artigo, afirma que o antigo recurso de culpar a vítima pelos males sociais permanece uma constante na epidemia peruana. Em vez de culpar os imigrantes chineses, desta vez os acusados de burlar a quarentena imposta pelo governo foram os trabalhadores informais, nacionais e estrangeiros.

O artigo sugere que a mudança de atitude em relação à comunidade chinesa no Peru durante a Covid foi parte de uma grande transformação geopolítica no papel da China e uma visão mais positiva dos chineses. “A ausência de episódios comparativamente violentos contra esse grupo em contraste com episódios semelhantes do passado é um fenômeno extraordinário de como a sociedade peruana está administrando a quarentena e a atual pandemia”, afirmam Ragas e Palma.

Leia na revista HCS-Manguinhos:

Covid-19, a diáspora chinesa e o legado duradouro do racismo no Peru, artigo de José Ragas e Patricia Palma (História, Ciências, Saúde – Manguinhos, vol. 29, n. 2, abr/jun 2022)