Junho/2014
Danielle Monteiro e Filipe Leonel | Agência Fiocruz de Notícias
O Brasil apresenta alto índice de cesarianas e, no setor privado, a situação é ainda mais alarmante. A conclusão é da pesquisa Nascer no Brasil, coordenada pela Fiocruz, em parceria com diversas instituições científicas do país e que foi divulgada nesta quinta-feira (29/5). O estudo, o maior já realizado sobre parto e nascimento no Brasil, revela que a cesariana é realizada em 52% dos nascimentos, sendo que, no setor privado, o valor é de 88%. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de que somente 15% dos partos sejam realizados por meio desse procedimento cirúrgico.
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Segundo a coordenadora da pesquisa, Maria do Carmo Leal, o número excessivo de cesarianas expõem desnecessariamente as mulheres e os bebês aos riscos de efeitos adversos no parto e nascimento. “O índice elevado de cesarianas se deve a uma cultura arraigada no Brasil de que o procedimento é a melhor maneira de se ter um filho. Em parte porque, no Brasil, o parto normal é realizado com muitas intervenções e dor”, esclarece.
Parto e gravidez
O estudo aponta que quase 70% das brasileiras deseja um parto normal no início da gravidez. Entretanto, poucas foram apoiadas em sua preferência pelo parto normal: nos serviços privados, esse valor foi de apenas 15% para aquelas que estavam em sua primeira gestação. “Há certamente uma influência do pré-natal na decisão das mulheres pelo tipo de parto, mas as amigas e os familiares também influenciam. Não se pode, entretanto, deixar de destacar que é uma visão equivocada achar que a cesariana é a forma mais segura para parir”, explica Maria do Carmo.
As cesarianas foram frequentes inclusive entre adolescentes (42%), resultado preocupante para os pesquisadores, já que mulheres com vida reprodutiva precoce tendem a ter número maior de filhos e, consequentemente, estão expostas a mais riscos nas gestações futuras. Entre as gestantes que tiveram parto normal, houve predominância de um modelo de atenção extremamente medicalizado, com intervenções excessivas e uso de procedimentos que, além de não serem recomendados pela OMS como de rotina, provocam dor e sofrimento desnecessários quando utilizados sem indicação clínica. “A maioria das mulheres ficou restrita ao leito e sem estímulo para caminhar, sem se alimentar durante o trabalho de parto, usou medicamento para acelerar as contrações e deu à luz deitada de costas, muitas vezes com alguém apertando sua barriga”, narram os estudiosos.
A pesquisa também aponta que modelos de atenção ao parto e nascimento, que têm enfermeiras obstétricas e obstetrizes como líderes e responsáveis primários pela realização de partos normais, aumentam as chances de partos espontâneos e diminuem as intervenções desnecessárias, sem comprometer a saúde das mulheres e dos bebês. “Este modelo de parto inclui as chamadas boas práticas obstétricas, como métodos não farmacológicos para alívio da dor, estímulo à movimentação, liberdade para se alimentar e posição verticalizada na hora de parir. Juntos, esses procedimentos tornam o parto mais confortável e menos doloroso”, explica Maria do Carmo.
Os dados ainda indicam que cerca de 30% das entrevistadas não desejaram a gestação atual, 9% ficaram insatisfeitas com a gravidez e 2,3% relataram ter tentado interromper a gestação. Além disso, a depressão materna foi detectada em 26% das mães entre 6 e 18 meses após o parto, sendo mais frequente entre as mulheres de baixa condição social e econômica, nas pardas e indígenas, nas mulheres sem companheiro, que não desejavam a gravidez e já tinham três ou mais filhos.
Apesar da cobertura universal no país, a atenção pré-natal foi baixa, com 60% das gestantes iniciando o pré-natal tardiamente, após a 12a semana gestacional, e cerca de um quarto delas sem receber o número mínimo de seis consultas recomendado pelo Ministério da Saúde. A mortalidade neonatal, por sua vez, esteve associada ao baixo peso ao nascer, ao risco gestacional e à inadequação da atenção ao pré-natal e ao parto, indicando uma qualidade não satisfatória da assistência.
Recém-nascidos
A proporção de nascimentos prematuros (antes de 37 semanas) encontrada no estudo foi de 11,3%. Quando comparado aos dados populacionais da Inglaterra e País de Gales, a ordem brasileira foi 55% maior. Em relação aos bebês que nasceram com 37 ou 38 semanas gestacionais, a proporção foi de 35%. “Embora não sejam considerados prematuros, são bebês que poderiam ganhar mais peso e maturidade se tivessem a chance de chegar a 39 semanas ou mais de gestação. A epidemia de nascidos com 37 ou 38 semanas no Brasil é, em parte, explicada pelo número elevado de cesarianas agendadas antes do início do trabalho de parto, especialmente no setor privado”, alerta o estudo.
Qualidade das instituições hospitalares
Os resultados ainda revelam escassez de medicamentos e equipamentos mínimos necessários aos atendimentos de emergência voltados à mulher e ao recém-nascido. As regiões com maior deficiência são a Norte e a Nordeste, seguidas pela Centro-Oeste, principalmente em estabelecimentos públicos e mistos. Já as regiões Sul e Sudeste apresentam índices próximos ou até superiores ao patamar da rede privada. A pesquisa também indica que o SUS foi o responsável pelo pagamento de 80% do total de partos, ocorridos em maternidades públicas e mistas.
A Nascer no Brasil entrevistou 23.894 mulheres. A pesquisa foi realizada em maternidades públicas, privadas e mistas, e incluiu 266 hospitais de médio e grande porte, localizados em 191 municípios, contemplando capitais e cidades do interior de todos os estados.
Mais informações:
(21) 2598-2453 e (21) 2270-5343
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