Maio/2014
Por Natania Nogueira | História Hoje
A primeira vez que ouvi a expressão “professor-pesquisador” foi em uma palestra de Selva Guimarães, lá por 1996. Na época, eu estava descobrindo que ser professora era muito mais do que estar numa sala de aula. Foi quando fiz meu primeiro projeto de educação patrimonial e comecei a fazer especialização em História Regional, na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG). Era uma idealista que estava apaixonada por duas coisas: educação e história. Comecei, então, a frequentar os arquivos e a ter contato com os documentos, algo que não havia ocorrido durante a minha graduação.
Considero que a pessoa responsável pela guinada que dei na minha vida foi o professor Abdeljalil Akkari, que hoje leciona na Universidade de Genebra. Eu o conheci em 1994, durante um seminário que aconteceu na Faculdade de Educação da UFJF. Ele não falava uma palavra em português, mas eu entendia o que ele falava em francês (acreditem, aprendi francês na educação básica em uma escola pública). Começamos ali uma amizade que completou este ano 20 anos. Parece que foi ontem. Foi ele quem me disse que eu seria uma ótima pesquisadora. Ele me incentivou, mesmo de longe, e me deu várias oportunidades de mostrar minha capacidade (que nem sabia que tinha).
Foi com ele que descobri que era uma professora, mas que poderia ser também uma pesquisadora. Uma coisa não impedia a outra, pelo contrário, complementava. Foi aí que comecei a escrever, a publicar, a relatar minhas experiências em sala de aula, a pesquisar história regional com mais empenho e a me interessar pela educação enquanto uma prática social. A educação patrimonial veio naturalmente, afinal, estou lidando o tempo todo com patrimônio, seja ele documental ou humano.
Falar que foi sempre fácil, seria mentira. Todo professor que deseja se tornar pesquisador tem que fazer sacrifícios. Normalmente, não se é remunerado por isso. É uma opção tanto pela qualidade do nosso trabalho quanto pela nosso enriquecimento profissional. Trabalhar com pesquisa pode abrir caminho para tornar a prática docente mais prazerosa, tanto para o professor quanto para o aluno. Por outro lado, a pesquisa é sempre um estímulo para o professor. Se eu era idealista aos meus 23 anos hoje, aos 43, ainda tenho a mesma energia.
Por isso, sempre aconselho os colegas e as pessoas que me pedem dicas que criem, que busquem produzir seu material de trabalho. Hoje, a internet facilita muito a pesquisa porque traz os arquivos e livros até nós. Se eu quiser trabalhar educação patrimonial com meus alunos, posso fazê-lo por meio de documentos que estão arquivados em outra cidade, outro estado, ou mesmo outro país.
É o que eu tenho feito e tem dado muito certo. Busco em arquivos virtuais material que possa ser usado em sala de aula para trabalhar não apenas história, como também patrimônio. Tenho preferência por periódicos (jornais e revistas). Eu os encontro digitalizados em acervos virtuais.
Moro no interior de Minas Gerais, mas posso encontrar material sabre a minha cidade e a minha região na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e no Arquivo Público Mineiro – sem sair do conforto da minha casa. Posso levar meus alunos ao laboratório de informática e mostrar a eles como era a nossa cidade há 100 anos, por meio de jornais e de fotografias. Posso trabalhar memória, posso trabalhar preservação e posso produzir um novo conhecimento dentro da escola. Um professor-pesquisador ajuda a criar estudantes que sabem pesquisar e gostam de fazê-lo.
Quando me refiro à pesquisa na escola, não estou me referindo àquela prática ultrapassada de pedir aos alunos que copiem em uma folha de papel um conhecimento já pronto. Estou falando de ensinar o aluno a criar conhecimento que possa ser utilizado tanto por ele quanto por seus colegas e mesmo seus professores.
Imagino que os professores que acompanham essa coluna semanal sejam ou desejem ser professores e pesquisadores. Imagino, também, que alguns deles podem se sentir inibidos em falar sobre o trabalho que realizam e sobre suas experiências na sala de aula. Para eles, deixo a dica: naveguem pelos arquivos, registrem suas atividades em caderno, publiquem suas experiências em um blog e percam a timidez. Temos uma grande ferramenta nas mãos, não podemos desperdiçá-la.
O “professor-pesquisador” é aquele que está sempre curioso, que produz parte do seu material e que assume o risco de divulgar seu trabalho é o futuro da educação no Brasil, em todos os sentidos. Ele não precisa ser mestre ou doutor, precisa apenas ser curioso e criativo.
Temos o poder de transformação nas mãos, não podemos ignorá-lo. Nosso aluno só irá ter consciência do seu papel na sociedade, da importância de preservar tanto o patrimônio quanto a memória se ele aprender a respeitar o fruto do esforço do outro. Ele aprende isso com o professor que cria, que ajuda a produzir conhecimento. Com o “professor-pesquisador”.
Dica:
Acervos virtuais que podem ser usados por professores de todas as áreas (não apenas história).
Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin – Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo (USP). http://www.bbm.usp.br/
Biblioteca Nacional Digital Brasil – Hemeroteca Digital Brasleira. http://memoria.bn.br/hdb/periodico.aspx
Arquivo Publico Mineiro. http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/
Arquivo Público do Estado de São Paulo. http://www.arquivoestado.sp.gov.br/
Fonte: História Hoje
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