Setembro/2016
Regina Castro (CCS/Fiocruz)
Pesquisadores de instituições públicas e privadas de ensino e pesquisa do Brasil e do exterior, entre estas a Fiocruz, divulgam nesta quarta-feira (21/9) um manifesto contra a revogação do Estatuto do Desarmamento. O documento tem como objetivo informar a sociedade sobre a efetividade do Estatuto do Desarmamento como instrumento para salvar vidas. Os especialistas ressaltam que as pesquisas mostram que mais armas em circulação não reduzem a criminalidade, mas, pelo contrário, fazem aumentar o número de homicídios, suicídios e acidentes fatais.
O manifesto será divulgado durante o 10º Encontro Anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que acontece de 21 a 23 de setembro em Brasília, na Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) da Universidade de Brasília. Entre as ações previstas, está também a entrega do documento a parlamentares.
A iniciativa é uma resposta à recente aprovação, por uma comissão da Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 3.722/12, que visa revogar o Estatuto do Desarmamento. Entre outros pontos, o projeto de lei reduz a idade mínima para aquisição de armas de fogo de 25 para 21 anos e autoriza indivíduos que respondem a inquérito policial ou a processo criminal a possuírem e portarem armas de fogo, inclusive aqueles processados por homicídio. O documento ainda terá que ser aprovado pelo Congresso Nacional. Na visão dos pesquisadores, o relaxamento da atual legislação sobre o controle do acesso de armas de fogo implica em mais mortes e ainda mais insegurança no país.
“Inegavelmente, o apelo à aprovação desse projeto de lei ganha força no rastro da sensação de insegurança que vivemos no Brasil. Sentimos o dever moral de dar ciência e transparência ao público das conclusões dos estudos científicos com o intuito de fomentar uma discussão séria sobre a efetividade da lei atual, sem visões ideológicas. Infelizmente, alguns legisladores tomam decisões sem se pautar em evidências científicas, mesmo quando elas existem”, afirmam os especialistas.
O documento ressalta ainda que há vários fatores estruturais e conjunturais relacionados ao nível da violência, tais como educação, desigualdade de renda, arranjo institucional e orçamento para a segurança pública. Assim, observam os pesquisadores, ao se avaliar o efeito da quantidade de armas em circulação deve-se levar em conta todos esses aspectos.
Estudos que abordaram o problema estatisticamente geraram evidências da relação entre armas de fogo e violência. Conduzidos em instituições de pesquisa brasileiras e internacionais, eles concluem que uma maior quantidade de armas em circulação está associada a uma maior incidência de homicídios cometidos com armas de fogo. Ao final, o documento lista estudos sobre o assunto e reivindica que os mesmos sejam considerados por parlamentares no Congresso Nacional, antes da decisão sobre a aprovação do projeto de lei.
O manifesto é assinado por 57 pesquisadores de instituições como Fiocruz, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Viva Rio, Instituto Igarapé, Universidade de Brasília, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Universidade de São Paulo, Universidade Federal do Ceará, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio Grande, Universidade Federal de Goiás, Harvard School of Public Health (EUA), Faculdade de Direito de Santa Maria, Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, dentre outras. Leia o manifesto na íntegra.
Leia em HCS-Manguinhos:
Violência e saúde como um campo interdisciplinar e de ação coletiva, artigo de Maria Cecília de Souza Minayo e Edinilsa Ramos de Souza, da Ensp/Fiocruz, que assinam o manifesto (v.4, n.3, nov. 1997)
Leia no Blog de HCS-Manguinhos:
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