Diário de bordo: em cartas à esposa, Oswaldo Cruz revela suas impressões sobre o Brasil

Cristiane d’Avila | Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz

Uma epopeia iniciada no alvorecer do século XX e revelada em cartas que descrevem um Brasil pouco conhecido, um desafio para os cientistas de então. Em viagens aos portos do norte e sul do país, entre 28 de setembro e 7 de novembro de 1905, Oswaldo Cruz descreve, em 16 missivas enviadas à esposa Emília Fonseca Cruz, a missão à qual estava incumbido como responsável pela Diretoria Geral de Saúde Pública: sanear aquelas localidades em atendimento a tratados internacionais, que então demandavam a reforma da organização sanitária das zonas portuárias brasileiras.

Quem conta essa história é a historiadora Ana Luce Girão, do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz. A partir dos documentos do arquivo do cientista sob a guarda da COC, Ana Luce descreve o percurso de Oswaldo Cruz e suas impressões sobre parte dos locais visitados, em 68 dias de viagem. O conjunto documental faz parte da série Correspondência do Fundo Oswaldo Cruz, o qual possui cerca de dois mil itens documentais de tipo textual, iconográfico e cartográfico, com datas-limite situadas entre 1885 e 1953. Segundo o artigo, aí está registrada, com considerável detalhe, a trajetória profissional, intelectual e administrativa do titular.

Trecho de carta de Oswaldo Cruz à sua ‘Miloca’

De acordo com a pesquisadora, Cruz fez o seguinte percurso de inspeção aos portos, partindo do porto do Rio de Janeiro: Cabo Frio (RJ); Vitória (ES); Caravelas, Porto Seguro, Santa Cruz e Salvador (BA); Aracaju (SE); Penedo e Maceió (AL); Tamandaré e Recife (PE), Cabedelo (PB); Natal, Mossoró e Assu (RN); Camocim, Fortaleza e Amarração (CE); São Luís (MA); Belém, Santarém e Óbidos (PA), Parintins e Manaus (AM). O propósito foi estabelecer, nessas 24 localidades, estações de desinfecção e hospitais de isolamento para os acometidos por cólera, peste bubônica e febre amarela.

“A série não está completa. A última carta disponível foi enviada de São Luís do Maranhão, mas sabemos que Oswaldo Cruz prosseguiu viagem até Manaus e, depois, aos portos do Sul”, explica a pesquisadora no artigo A bordo do República: diário pessoal da expedição de Oswaldo Cruz aos portos marítimos e fluviais do Brasil publicado na seção Fontes da revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos (vol.4, n. 1, mar/jun 1997).

As cartas de Oswaldo Cruz citadas no artigo, como também inúmeras outras, além de bilhetes, cartões-postais e fotografias do arquivo pessoal do cientista são o tema da exposição “Do teu saudoso Oswaldo”, que a COC exibe no Centro Cultural Correios, no Rio, de 29 de março a 30 de junho. Uma oportunidade para ver as missivas descritas na pesquisa de Ana Luce Girão e outras mais, revelando as impressões do cientista sobre o país, seus costumes e sua gente.

A exposição:

Ascom/COC

A partir da correspondência pessoal de Oswaldo Cruz, a mostra abrange um período que se inicia em 1889 e se estende após a sua morte, em 1917, aos 44 anos. São centenas de cartas, cartões-postais e bilhetes e fotografias que revelam o lado mais íntimo e humano desse personagem.

Em uma série de filmetes em formato de stories – narrativas audiovisuais curtas e fragmentadas hoje populares nas redes digitais – três atores (Bruno Quixotte, João Velho e Rafael Mannheimer) dirigidos por Sura Berditchevsky interpretam trechos das cartas de Oswaldo Cruz. Nessa correspondência, estão eternizadas as experiências cotidianas do cientista, suas observações atentas sobre os locais para os quais viaja, suas impressões sobre o trabalho e a troca de afetos com a família.

Oswaldo encontrava nas cartas um meio para aliviar a saudade dos familiares. Nelas, estão registrados comentários – alguns dos quais inusitados – à sua principal interlocutora, a esposa Emília da Fonseca, a quem carinhosamente chamava Miloca. As correspondências revelam um marido amoroso e espirituoso, um pai zeloso, características pouco conhecidas do personagem que influenciou uma geração de jovens médicos e pesquisadores brasileiros. Oswaldo não escondia as lágrimas, nem disfarçava a tristeza causada pela distância dos entes queridos, provocada por constantes e longas viagens que, com frequência, o privavam do convívio familiar

Concepção e realização

Concebida pela Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), a exposição “Do teu saudoso Oswaldo” é uma realização da Folguedo e tem gestão cultural da Sociedade de Promoção da Casa de Oswaldo Cruz (SPCOC), com apoio do Centro Cultural Correios. A mostra conta com patrocínio da Lei de Incentivo à Cultura da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (ISS), da Secretaria Municipal de Cultura, Concremat Engenharia e Tecnologia, Grupo Libra, Seres, Marsh e Guy Carpenter.

Serviço:

Exposição “Do teu saudoso Oswaldo”
Local: Centro Cultural Correios
Inauguração: 28 de março
Horário: 18 horas
Temporada: a partir de 29 de março a 30 de junho
Visitação: terça-feira a domingo, do meio-dia às 19h
Endereço: Rua Visconde de Itaboraí, nº 20 – Centro / Rio de Janeiro

Como citar este post: 

Diário de bordo: em cartas à esposa, Oswaldo Cruz revela suas impressões sobre o Brasil, Blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Publicado em 26 de marco de 2019. Acesso em 26 de marco de 2019. Disponível em http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/diario-de-bordo-em-cartas-a-esposa-oswaldo-cruz-revela-suas-impressoes-sobre-o-brasil/