Novembro/2016
A posição dominante das empresas estaduais de saneamento condiciona o processo decisório da política pública de saneamento no Brasil. É o que afirmam Ana Cristina A. de Sousa e Nilson do Rosário Costa, pesquisadores do Departamento de Ciências Sociais da Ensp/Fiocruz, no artigo Política de saneamento básico no Brasil: discussão de uma trajetória, publicado na atual edição de HCS-Manguinhos (vol.23, n.3, jul./set. 2016).
A centralidade das empresas estaduais de saneamento na prestação dos serviços de saneamento no Brasil teve sua origem com a implementação do Planasa pelo governo militar, em 1971. Geridas pelos respectivos executivos estaduais, elas atuariam por quase duas décadas segundo as diretrizes impostas pela União para o setor. Segundo os autores, os municípios foram alijados desse processo e assim permaneceram mesmo após a revogação do plano (1991), relegados a um papel passivo até a edição da nova Lei do Saneamento, em 2007.
Os pesquisadores contam que com o fim da ditadura militar a estrutura institucional e tecnológica criada pelo Planasa para a operação dos serviços no país sobreviveu praticamente intacta por meio da operação das empresas estaduais de saneamento, que passaram a dominar livremente a agenda setorial, atuando no novo contexto, sem regulação alguma. Elas, junto a outros beneficiários diretos e indiretos do arranjo estadualista, se tornariam um importante grupo de interesse e interlocução no setor de saneamento no novo contexto democrático.
De acordo com os pesquisadores, a aprovação do novo marco regulatório não respondeu de modo efetivo aos desafios da universalização do saneamento, e a manutenção do arranjo institucional histórico garantiu a hegemonia dos grupos estadualistas diretamente interessados nele. Uma trajetória de incentivos políticos e econômicos teriam permitido a consolidação hegemônica destas empresas ao longo do tempo.
“Este estudo partiu do princípio de que a política pública de saneamento é, acima de tudo, afetada por atores, interesses e instituições que permitiriam explicar o baixo desempenho observado nas últimas décadas”, afirmam. Para eles, o passado da política pública e a posição de dominância conquistada pelas empresas estaduais de saneamento explicariam alguns obstáculos importantes para o avanço das principais inovações regulatórias propostas pela União, no período democrático, para a modernização do setor.
Os autores acreditam que a lentidão no avanço da cobertura dos serviços não mais se justifica diante do aumento considerável dos recursos empenhados em programas da União para a expansão de sua oferta e da regulação setorial já disponível para os investidores. Eles defendem que estudos futuros reflitam sobre se os programas federais atualmente praticados se encontram preparados para enfrentar os desafios colocados pela trajetória do setor.
Leia em HCS-Manguinhos:
Política de saneamento básico no Brasil: discussão de uma trajetória, artigo de Ana Cristina A. de Sousa e Nilson do Rosário Costa (vol.23, n.3, jul./set. 2016)