Março/2021
Uma dezena de retratos de africanos num envelope encontrado entre artigos do Dr. Ayres Kopke (1866 – 1947) na Biblioteca do Instituto de Higiene e Medicina Tropical foi a pista para uma investigação sobre as “cobaias humanas” no Hospital Colonial de Lisboa nas primeiras décadas do século XX. Pouco abordado na história da medicina tropical à época do imperialismo colonial, o tema das experiências com seres humanos suscita polêmica.
No artigo “Hipnóticos” na metrópole: africanos no Hospital Colonial de Lisboa nas primeiras décadas do século XX, publicado na revista História, Ciência e Saúde – Manguinhos (v. 27, n. 4, out./dez. 2020), o historiador Sílvio Marcus de Souza Correa, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), apresenta resultados da pesquisa que desenvolveu durante a sua última estadia como professor visitante na Universidade Nova de Lisboa.
O professor da UFSC demonstra no artigo que dezenas de africanos acometidos pela chamada “doença do sono” foram enviados para o Hospital Colonial de Lisboa para servir ao estudo das patologias exóticas na Escola de Medicina Tropical, fundada em 1902. Acontece que a tripanossomíase humana africana não tinha cura naquela altura, e as dezenas de enfermos enviados para a metrópole foram usados nas experiências de Ayres Kopke, que testou vários fármacos e diferentes posologias na busca de uma cura para a “doença do sono”. O professor da Escola de Medicina Tropical de Lisboa parece não ter hesitado em testar pela primeira vez alguns tratamentos terapêuticos em seres humanos.
A pesquisa esclareceu ainda os trâmites para o envio dos doentes africanos para a metrópole e descobriu que as experiências com humanos no Hospital Colonial de Lisboa eram subsidiadas pelas próprias colônias, que remetiam à Escola de Medicina Tropical um valor correspondente a 1% da receita anual das suas câmaras municipais.
Leia em HCS-Manguinhos:
“Hipnóticos” na metrópole: africanos no Hospital Colonial de Lisboa nas primeiras décadas do século XX, artigo de Sílvio Marcus de Souza Correa (v. 27, n. 4, out./dez. 2020)