Novembro/2017
A tragédia da talidomida, no final dos anos 1950, foi um divisor de águas na regulação de medicamentos. Ela foi descoberta na Alemanha em 1953 para ser agregada a antibióticos, mas foi reconhecida mundialmente após 1957 como sedativo e hipnótico. Em 1961, entre 10 e 15 mil crianças nasceram com malformações após suas mães terem ingerido o medicamento durante a gestação.
No Brasil, o assunto talidomida nunca saiu da pauta de problema público, pois a falta de uma regulação efetiva do medicamento fez com novos casos de malformações aparecessem após a aparentemente retirada da droga de circulação em 1962.
No artigo A tragédia da talidomida: a luta pelos direitos das vítimas e por melhor regulação de medicamentos, Adriana Moro e Noela Invernizzi, respectivamente doutoranda e professora do Programa de Pós-graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Paraná, revisitam a história da talidomida e seus desdobramentos no plano regulatório e dos direitos das vítimas no Brasil com base em revisão de literatura, análise documental e reportes de jornais. Entre dezembro de 2014 e agosto de 2015, as autoras pesquisaram o acervo da Associação Brasileira de Portadores da Síndrome da Talidomida (ABPST) de notícias da mídia impressa veiculadas entre as décadas de 1960-1980.
“Observamos que a mídia se tornou um espaço para a voz das vítimas, jogando um papel relevante ao transformar o drama das famílias em um problema público. As organizações de vítimas e familiares, assim como médicos, advogados e outros atores demandaram publicamente maior controle da indústria farmacêutica e denunciaram as lentas respostas dadas às vítimas. A divulgação também auxiliou na conquista de outras pautas como os direitos dos portadores de deficiência e promoveu o debate social sobre questões bioéticas referentes aos conflitos de interesse na saúde, o direito à vida, o aborto, entre outros”, revelam.
Segundo as autoras, os eventos evidenciaram a carência de normas fortes para o uso seguro de medicamentos e o quão frágeis eram a regulação e as práticas de comunicação entre médicos e instituições, o que não apenas permitiu a ocorrência da tragédia como também gerou morosidade no seu enfrentamento. “As notícias denotaram a tremenda desigualdade entre o poder das empresas causantes do problema e as vítimas. A transformação dos acontecimentos em um problema público, mediante sua veiculação na mídia, e a crescente mobilização das vítimas, foram forças essenciais que pressionaram por uma regulação de medicamentos mais efetiva”, afirmam.
Leia em HCS-Manguinhos:
A tragédia da talidomida: a luta pelos direitos das vítimas e por melhor regulação de medicamentos, artigo de Adriana Moro e Noela Invernizzi (vol.24 no.3 Rio de Janeiro jul./set. 2017)