Museu Nacional abre exposição Kumbukumbu

Maio/2014

O trono de um rei Daomé, dado de presente a D. João em 1810, e objetos ritualísticos confiscados pela polícia no início dos anos 1940, quando as práticas do candomblé eram proibidas no Rio de Janeiro, integram a exposição Kumbukumbu – África, Memória e Patrimônio, aberta ao público em 14 de maio no Museu Nacional da UFRJ, na Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro.
bandeiradeguerraDaome

Bandeira de Adedozan, rei do Daomé

A exposição permanente apresenta 185 objetos do acervo de 700 peças pertencentes ao Museu Nacional/UFRJ, trazidas de diferentes partes do continente africano, entre 1810 e 1940, e acrescida de outros que pertenceram ou foram produzidos por africanos ou seus descendentes diretos no Brasil, entre 1880 e 1950. A nova exposição traz a público um pequeno tesouro escondido por muitos anos. Os visitantes poderão contemplar, ainda, parte da coleção da antropóloga Heloisa Alberto Torres (1895-1977), diretora do Museu Nacional entre 1940 e 1950, com objetos adquiridos nas principais casas de candomblé do recôncavo baiano. O destaque desta coleção são os alaka, tecidos africanos feitos em tear e trazidos da costa ocidental para o Brasil. A palavra Kumbukumbu, que dá nome à exposição, tem origem na língua swahili usada para objetos, pessoas ou acontecimentos que nos fazem pensar sobre o passado. Alerta sobre a dimensão do passado que abre um caminho para o futuro, destacando a ideia de memória e o patrimônio. África A África hoje é um continente que abarca 30 milhões de quilômetros quadrados distribuídos em 54 países e nove territórios, com mais de um bilhão de pessoas falando cerca de mil diferentes línguas. O continente tem riquezas incalculáveis em diamantes, petróleo e diversos minérios cuja exploração contribui para os maiores contrastes econômicos e sociais do mundo. Desde a antiguidade a África integrou as mais longas e importantes rotas comerciais e através delas entrou em contato com povos e culturas distantes. No século VII as caravanas árabes trouxeram o Islã para o norte da África; no século XV os cristãos chegaram à costa atlântica e a partir do final do XVII o crescimento do comércio atlântico de escravos levou à maior migração forçada da história moderna. A expansão colonial europeia sobre a África nos séculos XIX-XX rompeu a dinâmica histórica africana e estabeleceu novos padrões políticos e econômicos sustentados pela força militar, pelas alianças do poder colonial com elites africanas, e pela implantação de padrões europeus de vida moderna. Em meados do século XX os vitoriosos movimentos de independência começaram a mudar esse panorama, mas ainda hoje os países africanos enfrentam o desafio de vencer a pobreza, construir nações multiétnicas, multireligiosas e ao mesmo tempo democráticas e abertas às novas tecnologias e à globalização. A coleção que o Museu Nacional/UFRJ expõe não abarca a diversidade do continente africano. A maioria dos objetos data do século XIX, quando os países modernos ainda não existiam. Muitos deles foram recolhidos junto a povos que nunca tiveram contato histórico com o Brasil, outros estão relacionados à escravidão e à diáspora africana no Brasil. Todos fazem parte de um tempo que já passou e nos ajudam a conhecer o passado e a dar às pessoas e povos aos quais pertenceram um lugar na História. Trata-se de uma seleção de objetos trazidos de diferentes partes do continente africano entre 1810 e 1940, acrescida de objetos que pertenceram ou foram produzidos por africanos ou seus descendentes diretos no Brasil, entre 1880 e 1950. Passado e presente Os africanos estão hoje integrados ao mundo moderno, mas ainda preservam hábitos, crenças, técnicas de produção e rituais muito antigos. Os objetos expostos pelo Museu Nacional/UFRJ falam do passado e de como esse passado marca profundamente a história dos países africanos atuais. A África é e sempre foi um continente multiétnico, multirreligioso e poliglota. Os movimentos migratórios, a ocupação colonial e, posteriormente, os movimentos de independência levaram a uma divisão do território africano que não correspondia a essas fronteiras múltiplas e diferentes. Com isso, surgiram conflitos que se perpetuaram em guerras e outras formas de violência. Em meio a tantos povos e línguas e em um continente tão vasto, os africanos combinam suas diferenças com práticas e costumes hoje generalizados por todo o continente. Os instrumentos musicais e os ritmos são, talvez, os mais fortes exemplos da circulação de bens culturais dos povos africanos. Africanos no Brasil A presença de africanos e de seus descendentes no Brasil está marcada pela violência da escravidão e do pós-abolição. Na virada do século XIX para o XX os velhos africanos e seus descendentes nascidos no Brasil tiveram na religião um forte elemento aglutinador. No Rio de Janeiro esses núcleos eram conhecidos como zungus, casas de dar fortuna ou candomblés, onde se cultuavam inkices (bantu), orixás (yorubá) e voduns (jêje-mahi). As casas eram invadidas e tinham seus objetos rituais confiscados e levados às delegacias como provas materiais da prática de rituais alegadamente proibidos. Os frequentadores dessas casas eram perseguidos pela polícia e presos. Sabendo da existência desses objetos no depósito da Polícia, o então diretor do Museu Nacional, Ladislau Neto, interessou-se por eles e passou a pedir que os enviassem para estudo. Desde então o Museu Nacional preserva uma variada coleção de objetos que guardam as antigas técnicas de metalurgia e o conhecimento da arte da escultura em madeira, exemplos materiais das práticas religiosas dessa última geração de africanos e de seus descendentes diretos. A Coleção Heloisa Alberto Torres Entre 1940 e 1950 Heloisa Alberto Torres (1895-1977), então diretora do Museu Nacional, fez pelos menos duas viagens à Bahia, de onde trouxe uma importante coleção de objetos adquiridos nas principais casas de candomblé do recôncavo baiano. Dentre os objetos de maior destaque da coleção estão os alaka, tecidos africanos feitos em tear e trazidos da costa ocidental para o Brasil, sob encomenda, e aqui conhecidos como panos da Costa. Outro destaque é a coleção de orixás esculpidos em madeira, obra do artista popular Afonso de Santa Isabel. Kumbukumbu Kumbukumbu é uma palavra da língua swahili usada para objetos, pessoas ou acontecimentos que nos fazem pensar sobre o passado. Kumbukumbu nos alerta sobre a dimensão do passado que abre um caminho para o futuro por isso é usada nos museus para destacar a ideia de memória e o patrimônio. O swahili é uma língua amplamente falada na África oriental e sul que resulta de uma mistura do árabe, línguas estrangeiras e nativas. Por sua flexibilidade tornou-se a principal língua de interação dos povos no interior do continente africano. Serviço Exposição permanente Kumbukumbu – África, Memória e Patrimônio Museu Nacional/UFRJ Inauguração – 14 de maio de 2014 Quinta da Boa Vista – Bairro Imperial de São Cristóvão – Rio de Janeiro Aberto de terça a domingo das 10 às 17 horas, e segundas das 12 às 17 horas Ingressos: R$ 6 (inteira) e R$ 3 (meia) Gratuidade: crianças até 5 anos e portadores de necessidades especiais Telefone: 21 3938-6900 Fonte: Museu Nacional da UFRJ Leia no Blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos: Varíola, punição de Sakpata No ensaio Doenças, religião e medicina: a varíola no Benim, século XIXElisée Soumonni, do Benim, examina as percepções e interpretações das doenças no Daomé pré-colonial.   Leia em História, Ciências, Saúde – Manguinhos: Como viviam e morriam os escravos no Brasil? Treze artigos inéditos do suplemento Saúde e Escravidão revelam como viviam, adoeciam, eram curados ou morriam os escravos e libertos.