Conceitos, dimensões e diálogos para estudar o desequilíbrio entre sociedade e natureza

Junho/2025

ENTREVISTA | Maria Paula Diogo

Maria Paula Diogo

O conceito e as dimensões do Antropoceno – ou Antropocênico, como se diz em Portugal – povoam os pensamentos de Maria Paula Diogo, professora catedrática do Departamento de Ciências Sociais Aplicadas (DCSA) da Fundação para a Ciência e a Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-NOVA). Ao unir-se à equipe de editores-adjuntos de História, Ciências, Saúde – Manguinhos, a pesquisadora chega com o intuito de ampliar a presença de temas interdisciplinares na revista e estimular um diálogo crescente com áreas de fronteira com o core da publicação.

Por e-mail, Maria Paula Diogo conversou com o Blog de HCS-Manguinhos:

Em que você está trabalhando atualmente e qual foi a sua motivação?

Neste momento, a minha investigação centra-se no papel do conceito de Antropocênico em duas dimensões: (i) enquanto instrumento de análise das relações entre sociedade e natureza no contexto do sistema econômico atual e (ii) enquanto plataforma interdisciplinar, isto é, enquanto espaço de encontro de áreas científicas – das humanidades às engenharias, das artes às ciências da natureza, das ciências sociais às ciências da saúde.

No primeiro ponto, o meu objetivo é, partindo de uma abordagem da história da ciência e da tecnologia, analisar as assimetrias que marcam a responsabilidade dos vários atores, chamando a atenção para que os fortes desequilíbrios planetários que se fazem sentir na contemporaneidade como consequência da ação humana não podem ser vistos de forma homogênea ou free-floating. Neste contexto, eu própria e a equipa com quem trabalho desenvolvemos o conceito de “lumpen-natureza”, que permite, precisamente, explorar as práticas diversas desta relação desequilibrada entre sociedade e natureza. Esta linha de trabalho intersecta profundamente com a investigação que tenho desenvolvido desde há muito – em conjunto, claro, com colegas portugueses e estrangeiros – sobre centros e periferias e sobre ciência, tecnologia e império.

No segundo ponto, a equipe da qual participo tem trabalhado sobre o papel que conceitos de outras áreas disciplinares podem ter quando “mergulhados” na história da ciência e da tecnologia e como podem estas trocas de “instrumentos mentais” enriquecer a nossa capacidade de análise histórica.

Está preparando alguma novidade?

Neste momento tenho três capítulos de livros (todos em co-autoria com a colega Ana Simões), cujas versões finais acabei de trabalhar e que sairão muito em breve: “Center and Periphery as Historiographical Tools: the Art of the Fugue”, integrado na Cambridge History of Technology que sairá no decorrer deste ano; “Devil at the Crossroads. Negotiating concepts to understand the Anthropocene”, um capítulo sobre transferências epistemológicas; e “Women take the lead. A peripheral physics laboratory under the dictatorship”, sobre o papel das mulheres cientistas.

Como espera contribuir para a revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos como editora-adjunta?

Como editora-adjunta da Manguinhos espero contribuir para consolidar o prestígio que a revista já tem na área da História da Ciência e na História da Medicina. Adicionalmente, gostaria de reforçar a presença de temas interdisciplinares – incluindo de debate epistemológico e conceptual – que permitam um diálogo crescente com áreas de fronteira com o core da revista. A divulgação da revista, encorajando mais autores a submeterem os seus artigos, será também uma prioridade.

Três publicações recentes de Maria Paula Diogo:

Maria Paula Diogo, Paula Urze, Ana Simões, Cartoon diplomacy: visual strategies, imperial rivalries and the 1890 British Ultimatum to Portugal, The British Journal for the History of Science, 56(2) (2023): 147-166.

Maria Paula Diogo, José Luís Câmara Leme, Introduction: Prometheus in the Garden of Eden. Essays on the Anthropocene, HoST – Journal of History of Science and Technology, Vol. 16, 2 (December 2022): 3-15.

Ana Simões, Maria Paula Diogo (eds), Science, Technology and Medicine in the Making of Lisbon (1840–1940), Brill, 2022.