Janeiro/2023
César Guerra Chevrand | Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz
Histórias transculturais de psicoterapias: novas narrativas são o tema da nova edição da revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Coordenado pelos editores convidados Sonu Shamdasani (University College London) e Cristiana Facchinetti (COC/Fiocruz), o suplemento do volume 29 (dezembro de 2022) do periódico científico da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz) está disponível na íntegra no Scielo.
Em sua carta de apresentação, Sonu Shamdasani e Cristiana Facchinetti afirmam que a edição debate as “diferentes histórias das psicoterapias, considerando que a expressão conforma um conjunto de práticas, historicamente situadas, que incorporam e produzem valores culturais específicos que precisam ser investigadas em termos de circulação, troca e deslocamento de uma rede de práticas conectadas em diferentes domínios”.
De acordo com os editores convidados, a proposta se consolidou no interior de um grupo internacional coordenado por Shamdasani, que vem se encontrando anualmente desde 2016, com apoio da UCL Global Engagement Office. Com a institucionalização das atividades em 2019, por meio de um “Memorandum of Understanding” entre a UCL e a Fundação Oswaldo Cruz, novos membros ingressaram no grupo composto por psicólogos, psicanalistas, historiadores e filósofos da América Latina, da Ásia, da Europa e dos Estados Unidos.
No artigo que abre o suplemento, Sonu Shamdasani debate a crise de identidade da psicoterapia, a partir de reflexões sobre as historiografias das psicoterapias. Ao apontar as tentativas fracassadas de unificar o campo das psicoterapias, o professor da University College London propõe “ser o reconhecimento dos aspectos culturais e temporais nas psicoterapias ocidentais o que permite compreender as suas apropriações em contextos culturais radicalmente diferentes, em formas de redes recíprocas de troca”.
Na sequência, a professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde (PPGHCS/COC/Fiocruz) Cristiana Facchinetti analisa as interpretações médico-mentais sobre as relações entre arte e loucura, com base nas manifestações artísticas de internos do Hospício de Pedro II, primeira instituição psiquiátrica da América Latina (1852-1902). O artigo investiga as “razões pelas quais tais manifestações e as psicoterapias produzidas a partir delas foram em grande parte esquecidas pela historiografia”.
Análise
Outros nove artigos inéditos demonstram a diversidade das narrativas das histórias transculturais das psicoterapias.
Nos casos relativos ao Brasil, Guilherme Marques e Carolina Carvalho (Universidade do Estado do Rio de Janeiro Uerj) debatem a imigração no discurso médico-psiquiátrico brasileiro no fim da Segunda Guerra Mundial. Artigo de Carla Ribeiro Guedes (Universidade Federal Fluminense – UFF), Vanessa Maia Rangel (UFF) e Kenneth Rochel de Camargo Jr. (Uerj) analisa a formação do campo da “medicina psicossomática” no país, pensando a trajetória teórica e institucional de Julio de Mello Filho.
A psiquiatria imperial japonesa em Tóquio é o tema do artigo de Akihito Suzuki (University of Tokyo).
Suzanne Nortier Hollman (UCL) analisa a ascensão da psicanálise em hospitais dos Estados Unidos. A introdução da psicanálise na Itália a partir do século 20 é a pauta de Renato Foschi e Andrea Romano (Sapienza Università di Roma).
Jelena Martinovic (Université de Lausanne/Itália) debate a história da arteterapia e a sua relação com drogas alucinógenas como o LSD.
A recusa da interpretação do paciente em Freud, Jung e outros autores e teorias é a pauta do artigo de Marco Innamorati (Tor Vergata, University of Rome). Ulrich Koch (George Washington University) debate a história da “relação terapêutica” como uma tecnologia inserida nos Estados Unidos do século 20.
José Ignacio Allevi (Universidad Nacional del Litoral/Argentina) analisa a implementação dos tratamentos de choque em Rosário, na Argentina, entre 1936 e 1944.
Resenhas
Dois textos escritos por pesquisadores da Casa de Oswaldo Cruz compõem a seção Resenhas deste suplemento da HCS-Manguinhos. Eliza Teixeira de Toledo escreve sobre a obra Psiquiatria e política: o jaleco, a farda e o paletó de Antonio Carlos Pacheco e Silva, de Gustavo Tarelow, publicada pela Editora Fiocruz em 2020. Já Leonardo Bahiense analisa o livro Clínica, laboratório e eugenia: uma história transnacional das relações Brasil-Alemanha, de Pedro Muñoz (Ed. PUC/Rio, 2018).
Leia mais sobre cada artigo no Blog de HCS-Manguinhos:
Histórias transculturais de psicoterapias: novas narrativas
HCS-Manguinhos termina o ano com suplemento organizado por Sonu Shamdasani (University College London) e Cristiana Facchinetti (Fiocruz), que conversou com o blog da revista
Sonu Shamdasani discute crise de identidade da psicoterapia
“O campo da psicoterapia é estranho, pairando entre ciência, medicina, religião, arte e filosofia”, afirma professor do University College London em artigo na revista HCS-ManguinhosA arte dos alienados do Hospício de Pedro II apagada da história
Arteterapia e alucinógenos
A história da arteterapia e a sua relação com drogas alucinógenas como o LSD é tema de um artigo na revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Jelena Martinovic, pesquisadora de institutos na Suíça, analisa como a psicofarmacologia transformou a relação entre a arte e a psiquiatriaPesquisa examina estadas de imigrantes coreanos em hospitais psiquiátricos no Japão de 1920 a 1945
Quando o paciente diz ‘não’
De relação terapêutica a tecnologia social
Entre a política e a psiquiatria de Antônio Carlos Pacheco e Silva
Guerra e loucura: o discurso dos psiquiatras brasileiros sobre os refugiados europeus do pós-guerra
A medicina psicossomática e o legado de Julio de Mello Filho
O Hospício da Praia Vermelha do Império à República
Conversamos com Ana Teresa A. Venancio sobre a obra que organizou com Allister Teixeira Dias, reunindo pesquisas recentes sobre o Hospício Nacional de Alienados, no Rio de Janeiro, de 1852 a 1944