“Venenos raciais”: a eugenia “preventiva” de Belisário Penna

Novembro/2022

Há cem anos, o médico-sanitarista mineiro Belisário Penna (1868-1939), um dos protagonistas da história da saúde pública no Brasil, utilizou a teoria da eugenia como suporte para o seu projeto de saneamento e interpretação de nação. Mas de que modo a eugenia foi adaptada para atender demandas da saúde pública e de um projeto de “reforma sócio-racial” da população brasileira?

Belisário Penna, ao centro, discursa para a população sobre medidas profiláticas de saneamento num Posto Sanitário. Fonte: Departamento de Arquivo e Documentação/COC/Fiocruz

Embora o envolvimento de Belisário Penna com a eugenia não seja novidade, o historiador Leonardo Dallacqua de Carvalho debruçou-se sobre a produção intelectual do médico para analisar como esta relação ocorreu – suas orientações teóricas, a ligação com o contexto social e científico do Brasil e a condição em que a eugenia foi vinculada a projetos de saúde pública na década de 1920. 

No artigo Sanear é eugenizar: a eugenia “preventiva” de Belisário Penna a serviço do saneamento do Brasil, 1920-1930 (História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v. 29, n. 3, jul./set. 2022), Dallacqua de Carvalho, pesquisador da Fapema no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual do Maranhão, analisa em que medida o tema da eugenia esteve alinhado aos projetos de saneamento e de “consciência sanitária” do médico. 

Belisário Penna. Acervo da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz

O autor discute dois conceitos fundamentais para o pensamento de Penna: “raça brasileira” e eugenia “preventiva”. Segundo a chamada eugenia “preventiva”, “venenos raciais”, como álcool e sífilis, causariam a degeneração da prole. Na campanha sanitária, era preciso, portanto, promover  o combate incansável a estes males, mesmo que para isto fosse permitida a interferência do Estado na vida privada do cidadão.

Favorável à vigilância da população e à intervenção para coibir práticas que ameaçassem o reformismo social que almejava, Penna chancelou uma “legislação antialcoólica” fundamentada na ideia de que um indivíduo doente poderia causar danos aos demais, e portanto as condições de saúde de um indivíduo não eram um assunto privado ou um direito natural, como a liberdade individual.

“A eugenia tem despertado interesse pelo seu poder de adaptação em diferentes contextos sociais”, afirma Dallacqua de Carvalho, doutor em História das Ciências e da Saúde pela Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz.

Leia em HCS-Manguinhos:

Sanear é eugenizar: a eugenia “preventiva” de Belisário Penna a serviço do saneamento do Brasil, 1920-1930, artigo de Leonardo Dallacqua de Carvalho (História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v. 29, n. 3, jul./set. 2022)

Belisário Penna: notas fotobiográficas, artigo de Eduardo Vilela Thielen e Ricardo Augusto dos Santos (História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v. 9, n. 2, ago/2002)

Imagens de Belisario Penna no arquivo da Casa de Oswaldo Cruz