Fevereiro/2022
Com roupa de caçador e mente de colonizador, Theodore Roosevelt posou orgulhoso com o seu “belo troféu” – o corpo de uma onça morta – para as lentes do filho Kermit, verdadeiro autor do tiro que abateu o animal. O ex-presidente dos Estados Unidos da América (1901-1909) viajou ao noroeste brasileiro em 1913 e 1914, acompanhado do então coronel Cândido Rondon, em busca de informações sobre a fauna amazônica, especialmente a onça-pintada.
No artigo Em busca das onças: as fotografias do jaguar sul-americano no relato de viagem de Theodore Roosevelt, publicado na seção Imagens da revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos (v. 28, supl., dez 2021), a historiadora Cecília Rattes, do Centro de Estudos Animais/Universidade Federal de Minas Gerais, aborda a Expedição Roosevelt-Rondon, que teve apoio financeiro do Museu de História Natural de Nova York, interessado em obter coleções zoológicas de espécies que habitavam a região noroeste do Brasil.
Segundo a historiadora, aliando fotografia e caça esportiva, Roosevelt pretendia criar um repertório visual do animal. “Entretanto, o terreno inóspito da floresta, o caráter furtivo e a rapidez dos movimentos das onças, assim como as limitações técnicas da fotografia, desafiaram suas pretensões”, revela.
A autora examinou fotografias de animais produzidas por Roosevelt durante a viagem, assim como os retratos do Señor Lopez, famosa onça do Zoológico do Bronx, e observou no material publicado “uma curiosa ‘representação do ausente'”.
“Por meio de suas fotografias e do relato escrito, Roosevelt produziu um mundo colonial amazônico. Ele reconstruiu e se apropriou de tudo aquilo que era de seu interesse ou da sua audiência”, afirma a historiadora.
Segundo ela, o ex-presidente selecionou o conteúdo a ser publicado, cortou passagens, inseriu dados, trocou palavras, sequenciou capítulos e fez um trabalho de memória que, na sua percepção, recriaria “fielmente” a viagem ao Brasil. “Suas imagens da onça-pintada eram construídas e inseridas no relato sinalizando uma lógica de organização e pensamento, de ordenação de espaços sociais e de mediação dos tempos culturais, tornando-se representações do mundo que refletiam os códigos culturais de seu produtor”, atesta.
Para a autora, ao retratar a região com os “olhos do império”, como “primitiva”, “desocupada” e “selvagem”, Roosevelt validava sua presença e futuras investidas estrangeiras sobre o território brasileiro.
Leia na revista HCS-Manguinhos:
Em busca das onças: as fotografias do jaguar sul-americano no relato de viagem de Theodore Roosevelt, artigo de Cecília Luttembarck Oliveira Lima Rattes (História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v. 28, supl., dez/2021)
Reciprocidades em desequilíbrio: história das relações entre animais, Carta dos Editores Convidados Regina Horta Duarte, Gabriel Lopes, Natascha Stefania Carvalho De Ostos e Nelson Aprobato Filho (HCS-Manguinhos, v. 28. supl., dez/2021)
Acesse o número especial sobre relações entre animais (HCS-Manguinhos, v. 28. supl., dez/2021)
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Release do suplemento especial sobre a história das relações entre animais