Junho/2020
Em 27 de maio, no congresso virtual da UFBA 2020, foi realizada a mesa online Pandemia na África – epidemiologia e algocracia, com a participação de Livio Sansone, Jamile Borges da Silva, Valdemir Donizete Zamparoni, Colin Major Darch, Cardoso Armando, Lamine Badji, Paulo Veríssimo e Teresa Cruz e Silva. A partir de hoje, publicaremos os textos referentes às apresentações, começando pela abertura do professor Livio Sansone, da UFBA.
Livio Sansone*
O continente africano tem ficado bastante fora da cobertura midiática sobre a pandemia aqui no Brasil, e quando ele não é ignorado, como frequentemente acontece com a África, as informações são desencontradas ou em tom exagerado. Isso não é somente injusto, mas é também estúpido do ponto de vista da pesquisa e de uma perspectiva universal sobre o avanço da pandemia e seu combate.
Em primeiro lugar há um debate forte e vivaz pelas redes sociais africanas, dentro de um contexto em constante mudança, embora em geral caraterizado pelo crescimento da contaminação.
Em África estão se dando fenômenos interessantes neste âmbito. Existem lados negativos, como a pobreza e a falta de infraestrutura, que dificultam tanto a higienização como o isolamento, a crônica escassez de atendimento à saúde da grande maioria da população, associado a uma postura das elites frente a saúde que é ainda mais brutal do que no Brasil e na América latina (com a tradição de sair do país para se tratar, rumo a Europa, EUA e África do Sul).
A África possui, ademais, um acumulado de morbidade e doenças crônicas que podem deixar a população mais exposta, o desmonte do Estado em vários países que ainda não se recuperaram das intervenções estruturais de duas décadas atrás e uma dívida internacional que comprime os investimentos sociais. Tudo isso pode levar a uma substantificação por falta de campanhas de antecipação e testagem em massa, que são relativamente caras.
Além disso, também em África as redes sociais podem ser usadas para espalhar fake news e dificultar as campanhas de prevenção. As fake news são um desafio global com construções e significados políticos locais.
Ora, há também lados positivos a destacar, como a experiência na luta a outras pandemias, a atenção para a saúde básica, a medicina praticada com recursos simples, as atividades de associações comunitárias, de ajuda mútua e não-governamentais e o uso criativo e informativo das redes sociais. Por estas redes, há muitas vozes em prol de um debt relief, de uma amenização da dívida para o continente africano. Ademais, como sempre, há grande diferenças dentro do continente africano, em termos de soberania médica, alimentar ou financeira. Por exemplo, Senegal e Angola são muito menos autossuficientes que a África do Sul.
Apresentamos em seguida um conjunto de depoimentos de vários países africanos. Embora os dados estatísticos apresentados estejam em constante mudança e, geralmente, em aumento, os textos apresentam questões e debates que continuam validos e indicam interessantes tendências.
* Livio Sansone é professor titular de Antropologia do Programa de Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos (Posafro) do Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia. sansone@ufba.br
Como citar este post:
SANSONE, Livio. Pandemia na África. Blog de HCS-Manguinhos. Publicado em 16 de junho, 2020. Acesso em 16 de junho, 2020. Disponível em http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/pandemia-na-africa
Leia em HCS-Manguinhos:
Hiperbólicos italianos: as viagens dos integrantes da Escola Positiva de Antropologia da Itália pela América meridional, 1907-1910, artigo de Livio Sansone (HCS-Manguinhos, vol. 27, n. 1, jan./mar. 2020)
Leia no especial HISTÓRIA E CORONAVÍRUS no Blog de HCS-Manguinhos: