Os manguezais e nós: obra de Marta Vannucci é tema de artigo em HCS-Manguinhos

Junho/2020

A destruição ou mau gerenciamento dos manguezais leva a um empobrecimento catastrófico, repentino ou gradual, da faixa litorânea tropical. Não somente serão perdidos os rendimentos dos manguezais e seus arredores, como também serão perdidos os benefícios indiretos. As maiores perdas estão sempre na área da saúde e educação da população humana, na queda da produção pesqueira, na perda cultural de sabedoria tradicional e no desaparecimento sub-reptício de todos os serviços que os manguezais saudáveis prestam silenciosa e ininterruptamente. Cortem-se os manguezais e não haverá somente desertos, mas, pior ainda, haverá desertos poluídos” (Vannucci, 2002, p.17).

Marta Vannucci. Foto: ABC

Marta Vannucci, nascida em 1921, é considerada uma das mais importantes cientistas brasileiras, com diversos artigos e livros publicados. Apesar do reconhecimento nacional – foi a primeira mulher a se tornar membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC) – e internacional pela sua produção científica, ainda não recebeu a devida atenção por parte da historiografia das ciências, segundo Alex Gonçalves Varela, professor do Departamento de História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

No artigo “Uma dádiva das marés’: os estudos sobre manguezais da cientista Marta Vannucci em sua trajetória internacional, 1969-1989“, publicado na atual edição de HCS-Manguinhos (vol.27, n.1, jan/mar 2020), Varela explora a trajetória internacional da pesquisadora, que completou 99 anos no último 10 de maio. 

Na década de 1940, a bióloga foi convidada a integrar a equipe de pesquisadores do Instituto Paulista de Oceanografia (IPO), criado em 31 de dezembro de 1946. Cinco anos depois, o IPO foi incorporado à USP, tornando-se o Instituto Oceanográfico (IO-USP), onde Marta foi pesquisadora e diretora até 1969, quando iniciou sua trajetória internacional como cientista.

No artigo, Varela destaca sua atuação na Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) a partir de 1969 sobre mangues na Ásia e no Pacífico. Produto da atuação de Marta Vannucci nesse programa, o livro Os manguezais e nós é o objeto de análise crítica do artigo, que contextualiza a produção da obra, analisa a sua estrutura, a existência ou não de controvérsias científicas sobre os mangues, os autores com os quais Vannucci dialoga e os que refuta, e descreve o ecossistema manguezal, os elementos da fauna e da flora que o integram, sua utilização e processos de conservação, bem como propostas para uma melhor gerência dos mangues, entre outras questões.

Manguezal na Malásia. Foto: Wikipedia.

A obra começou a ser redigida em 1986, quando a autora apresentou o texto original em inglês, e foi publicada pela primeira vez em 1989, em Nova Dehli, na Índia. A primeira edição brasileira, publicada pela Editora da Universidade de São Paulo, é de 1999, tendo sido editada com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

A obra está estruturada em três partes, um apêndice com um artigo de Luiz Drude de Lacerda, “Os manguezais do Brasil”, e um artigo da própria autora, “Dez anos mais tarde”, além de bibliografia e índice remissivo. Ao final, há uma seleção de 68 imagens.

Na primeira parte, “Os manguezais”, a autora analisa a origem africana da palavra mangue e observa que o termo tornou-se por muito tempo sinônimo de perigo, confusão, terras inóspitas. “Os manguezais eram considerados áreas inúteis, sem reconhecimento algum, sem valor intrínseco, não oferecendo nada à humanidade. Contudo, nos dias de hoje, o nome mangue está reabilitado, passando a ser mais bem compreendido por meio da pesquisa, e os manguezais do mundo passaram a ser usados e gerenciados com mais e melhores critérios”, afirma Varela. A seguir, Vannucci comenta sobre a floresta, a fauna, as águas que vão e vêm com as marés, os solos, ecossistema manguezal e a interferência humana.

Mangue-vermelho na Bahia. Foto de Jonathan Wilkins/Wikipedia.

A segunda parte do livro, “Nós”, foi dividida em quatro segmentos: “O homem como observador”, “O homem como morador”, “O homem como usuário” e “O homem como explorador e destruidor”. A última parte, “Os manguezais e nós”, aborda “Manguezais e desenvolvimento” e “O desenvolvimento dos manguezais”. Na conclusão, a autora argumenta sobre a necessidade de se conceder atenção especial ao ecossistema manguezal de todo o mundo. “É o registro de uma cientista prática, que acredita no poder da ciência como instrumento para a solução dos problemas existentes no ecossistema e na racionalização de seu uso”, afirma Varela.

Leia em HCS-Manguinhos:

“Uma dádiva das marés”: os estudos sobre manguezais da cientista Marta Vannucci em sua trajetória internacional, 1969-1989, artigo de Alex Gonçalves Varela (vol.27 n.1, jan/mar 2020)

Como citar este post:

Os manguezais e nós: obra de Marta Vannucci é tema de artigo em HCS-Manguinhos. Blog de HCS-Manguinhos. Publicado em 05/06/2020. Visualizado em 05/06/2020. Disponível em: http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/os-manguezais-e-nos-obra-de-marta-vannucci-e-tema-de-artigo-em-hcs-manguinhos/