Março/2018
Marina Lemle | Blog de HCS-Manguinhos
Presidente da Associação Nacional de História (Anpuh) pelo biênio 2018-2019, Joana Maria Pedro, professora titular da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), há tempos estuda e debate gênero e feminismo na pesquisa histórica e interdisciplinar. Para marcar o Dia Internacional da Mulher, convidamos a historiadora para refletir sobre a data diante da nova onda feminista e sobre o cenário da pesquisa envolvendo relações de gênero e feminismo.
Enquanto a chamada “primeira onda feminista”, no século XIX e início do XX, centrou-se principalmente na reivindicação de direitos políticos das mulheres, como votar e ser eleita, a “segunda onda”, depois da Segunda Guerra Mundial, priorizou lutas pelo direito ao corpo, ao prazer, e contra o patriarcado. A “terceira onda”, nos anos 1990, focaliza a diversidade das mulheres, diferentes em cores, etnias, nacionalidades, religiões e origens culturais. Estamos vivendo uma “quarta onda” do feminismo? Uma “primavera das mulheres”? Como esse movimento se caracteriza?
Possivelmente sim, uma “Quarta Onda” que se dá nas ruas em grandes manifestações, mas principalmente através do espaço das redes sociais. Diferente das anteriores que conquistaram novos direitos, muito da “primavera das mulheres” ou quem sabe a “Quarta Onda”, acontece para não perder direitos duramente conquistados, para combater a cultura do estupro, para lutar contra a violência.
Como os estudos interdisciplinares sobre as relações de gênero e feminismo podem contribuir para a pesquisa histórica?
Pensar os dados da pesquisa histórica a partir do gênero e de feminismo é introduzir uma abordagem que torna mais complexo o resultado da pesquisa, enfim a escrita da história. E sim, a questão de gênero e do feminismo é uma contribuição interdisciplinar, mesmo porque a história foi uma das últimas disciplinas a trazer esta abordagem para a pesquisa. A interdisciplinaridade pressupõe a complexidade da realidade e esta abordagem é muito útil para pensar o gênero e o feminismo.
Quais as principais questões metodológicas?
Há muito tempo as historiadoras feministas já lembravam que não é por falta de fontes que não se escrevia a história das mulheres. O que havia era uma “invisibilidade ideológica”, é preciso querer achar as mulheres nas fontes. Há aqui portanto a necessidade de levantar outras perguntas para as fontes, olhar documentações antes não pensadas para a pesquisa histórica. E, muitas vezes, olhar as mesmas fontes, mas procurando outras questões. Como exemplo posso levantar o fato de que por muito tempo se usou a imprensa como fonte histórica, mas foram as historiadoras feministas que viram nestas fontes a presença de mulheres, foram elas que viram a própria imprensa como instrumentos para “construir o gênero”, para dizer como devia ser uma mulher ou um homem.
Um recado ou comentário sobre o Dia Internacional da Mulher?
A luta das mulheres que ocorre no cotidiano, em todos os dias, costuma ser materializada no dia 8 de março, com atividades, marchas, panfletagens. Mas também com homenagens, entrega de flores, e com empresas que fazem divulgação de um “modelo de mulher” que justamente o feminismo quer questionar. Meu recado é “Se é para entregar flores, que seja como uma declaração de que as mulheres contribuem para esta sociedade das mais diversas maneiras, e que lugar de mulher é onde ela quiser. Sem limites.”
Como citar este post:
Joana Maria Pedro: ‘Lugar de mulher é onde ela quiser. Sem limites’, entrevista de Joana Maria Pedro a Marina Lemle. Blog de História, Ciências, Saúde – Manguinhos, 2018. Publicado em 8 de março de 2018. Acesso em 8 de março de 2018. Disponível em http://www.revistahcsm.coc.fiocruz.br/joana-maria-pedro-lugar-de-mulher-e-onde-ela-quiser-sem-limites/