Academia de Ciências dos Estados Unidos elege pela primeira vez brasileira
Cristina Caldas, de Boston | Agência Fapesp
A médica Ruth Nussenzweig, professora na Universidade de Nova York, é a primeira cientista brasileira a ser eleita como membro da Academia de Ciências dos Estados Unidos (NAS, na sigla em inglês), em 150 anos de história da consagrada instituição.
Ruth junta-se agora na NAS a outros três pesquisadores e professores brasileiros: seu filho Michel Nussenzweig, da Universidade Rockfeller, José Nelson Onuchic, da Universidade Rice, e José Scheinkman, da Universidade Princeton. O anúncio foi feito no dia 30 de abril.
Na categoria Associado Estrangeiro, o Brasil teve como representante eleito este ano Vanderlei Bagnato, professor titular no Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Centro de Ciências Ópticas e Fotônica (CePOF), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP. Em setembro de 2012, Bagnato foi eleito membro daPontifícia Academia de Ciências, no Vaticano.
Bagnato junta-se a Aloisio Araujo, Luiz Davidovich, Sérgio Henrique Ferreira, Ivan Izquierdo, Warwick Kerr, Jacob Palis e Francisco Mauro Salzano. Incluindo Max Birnstiel, nascido no Brasil e agora cidadão suíço, a representação brasileira na NAS chega atualmente a 13 cientistas.
Nova pesquisa no Brasil
Professora no Departamento de Parasitologia da Escola de Medicina da Universidade de Nova York, Ruth trabalha com seu marido, o também pesquisador Victor Nussenzweig, desde os tempos de estudante na Faculdade de Medicina da USP. “Naquele tempo éramos só amigos e trabalhávamos em projeto de moléstia de Chagas. Cabulávamos muita aula”, contou.
Reconhecida mundialmente por suas pesquisas pioneiras em malária, doença transmitida por mosquitos Anopheles infectados com parasitas Plasmodium, Ruth começou desenvolvendo um modelo experimental para estudo da imunidade contra o parasita.
“Ela foi a primeira a mostrar imunidade contra o esporozoíto do Plasmodium, um dos estágios de desenvolvimento do parasita”, disse Momtchilo Russo, professor no Departamento de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP.
Em trabalho publicado na década de 1960, Ruth imunizou camundongos com esporozoíto irradiado, incapaz de se multiplicar, e em seguida infectou os mesmos animais com esporozoíto normal, retirado da glândula salivar do mosquito, mostrando que os animais não desenvolviam a malária. Foi sua primeira grande contribuição na pesquisa por vacinas contra malária.
Em seguida, isolou o antígeno responsável por proteger os animais da doença, e a partir daí passou a trabalhar em vacinas e tratamentos. “O modelo experimental robusto que desenvolveu serviu como base para o desenvolvimento da vacina contra malária que está mais avançada no momento e que já foi testada em humanos, usando o antígeno CSP (circumsporozoite protein), isolado por ela”, explicou Ricardo Gazzinelli, professor na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Por seu pioneirismo, Ruth tem grande influência em diversas áreas da biologia experimental incluindo imunologia, biologia parasitária e desenvolvimento de vacinas. “Seus trabalhos na área de imunologia servem como guia para o desenvolvimento de uma nova geração de vacinas recombinantes”, disse Maurício Martins Rodrigues, professor da Universidade Federal de São Paulo que fez o pós-doutorado na Universidade de Nova York com Ruth Nussenzweig.
Sempre usando técnicas de fronteira, Ruth e seu grupo foram os primeiros a clonar um antígeno de parasita e produziram o primeiro anticorpo monoclonal contra o antígeno de parasita, segundo Gazzinelli. Outro legado do casal Nussenzweig para a ciência, em especial a brasileira, tem sido o treinamento de vários estudantes e pós-doutores que hoje são importantes líderes na área de imunologia, vacinologia e parasitologia.
Questionada sobre como reagiu ao receber a notícia da eleição, Ruth, perto de completar 85 anos, disse à Agência FAPESP que a distinção veio “um pouco tarde para mim, mas tomara mesmo que anime as cientistas mais jovens”.
“A indicação deveria ter ocorrido há 20 anos, mas certamente é um momento ímpar para o Brasil”, destacou Rodrigues.
Agora o casal Ruth e Victor se prepara para voltar a pesquisar no Brasil, após décadas radicados no exterior, em um projeto apoiado por meio do São Paulo Excellence Chairs (Spec), programa-piloto da FAPESP que busca estabelecer colaborações entre instituições do Estado de São Paulo e pesquisadores de alto nível radicados no exterior.
“A FAPESP tem sido muito generosa e temos tido facilidade para trabalhar em colaboração com colegas mais jovens. Hoje em dia não fazemos mais a pesquisa, discutimos, e é dessa maneira que temos uma certa influência”, disse Ruth.
Rodrigues, um dos professores que irá trabalhar com o casal Nussenzweig no Brasil, afirma que eles são sempre uma grande fonte de estímulo para os cientistas mais jovens. “Nunca param de querer saber mais e descobrir novas coisas”, disse.
Fonte: Agência Fapesp