Aids: 30 anos depois, jovens em risco

Dezembro/2015

O Dia Mundial pretende não só divulgar mensagens de solidariedade a todos os recantos do mundo, como estimular a discussão e a ação entre pessoas que habitualmente não se sentem ameaçadas pela Aids. Dilene Raimundo do Nascimento, HCS-Manguinhos, 1997.

Marina Lemle | Blog de HCS-Manguinhos

Cuide_se_Aids_legenda Para marcar o Dia Mundial de Luta contra a Aids, entrevistamos a médica Dilene Raimundo do Nascimento, professora do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz e coordenadora nacional do GT de História da Saúde e das Doenças da Anpuh. Autora do artigo A face visível da Aids, publicado em HCS-Manguinhos em 1997, Dilene nos dá uma ideia de como caminharam as políticas de prevenção e de atenção no Brasil nos últimos 30 anos. Desde que a Aids começou a aparecer no Brasil, no início dos anos 1980, até hoje, como se delinearam as políticas de prevenção e de atenção? As políticas de prevenção a Aids e de atenção aos doentes, desde o surgimento da doença no Brasil, em 1983, tiveram vários momentos, que inclusive incorporavam os conceitos e preconceitos em relação a doença. No início, a AIDS surgiu como “doença de homossexuais” e vinculada a morte. Sua baixa incidência e seu acometimento em grupos específicos foram argumentos utilizados pelo Ministro da Saúde, à época, em 1985, para justificar a prioridade em relação a outras doenças infecciosas existentes no Brasil, como tuberculose, esquistossomose, malária etc, e não priorizar uma política em relação a Aids. Mas a incidência da Aids rapidamente se tornou elevada. O Ministério da Saúde passou a veicular na televisão peças de campanha de prevenção com frases impactantes como “A Aids mata!”, “Quem vê cara não vê Aids”. Isto é, frases impactantes, agressivas, preconceituosas e sem esclarecimento algum em relação à doença. Os homossexuais resolveram não morrer em silêncio e criaram organizações não governamentais para cobrar do governo esclarecimentos sobre a doença e atenção aos doentes de Aids. Aliado a uma pressão internacional para que os países estabelecessem políticas de controle da doença, que começava a se apresentar como uma pandemia, foi criado o Programa Nacional DST/Aids. No início da década de 1990, com um empréstimo de 90 milhões de dólares do Banco Mundial, o Ministério da Saúde fez parceria com as ONGs existentes para criarem programas de prevenção à doença. O que foi extremamente positivo à época, considerando a participação da sociedade civil nos programas. Em 1996, com o advento do tratamento com antirretrovirais associados, conhecido como “coquetel”, não se morreria mais de Aids desde que se tivesse acesso aos medicamentos, o que se fez possível com a decisão do governo federal de fornecer gratuitamente o tratamento a todos os doentes de Aids. Essa decisão fez a diferença. O Brasil foi o único país do mundo a estabelecer essa política. A atenção aos pacientes de Aids no Brasil já foi considerada um caso de sucesso. Por quê? Ainda é? A participação da sociedade civil, o acesso gratuito universal ao tratamento com os antirretrovirais, inúmeras leis de direitos humanos aos soropositivos fizeram do programa brasileiro um caso de sucesso. Contudo, com a interiorização e a pauperização da Aids, atingindo um contingente populacional que já não tem acesso aos serviços de saúde, houve um refluxo no programa DST/Aids. Quais os principais riscos hoje e como contê-los? Hoje, passados mais de 30 anos do surgimento da Aids, com um refluxo no programa, um contingente de jovens nascidos pós-coquetel inicia sua atividade sexual sem ter interiorizado a necessidade do uso da camisinha, resultando num grande risco de disseminação da Aids entre os jovens. Mas parece que o Ministério da Saúde está atento, utilizando uma linguagem voltada para os jovens, inclusive com hashtags, nas campanhas atuais de prevenção à Aids. Saiba mais: Aumento de Aids entre jovens no Brasil preocupa De 2004 a 2014, houve aumento de 41% na taxa de detecção entre pessoas de 15 a 24 anos Leia em HCS-Manguinhos: Nascimento, Dilene Raimundo do. A face visível da Aids. Jun 1997, vol.4, no.1  Andrade, Maria de Fatima de Oliveira, Martins, Maria Cezira Fantini Nogueira and Bógus, Cláudia Maria Casa Siloéa história de uma ONG para crianças portadoras de HIV/AIDS. Dez 2007, vol.14, no.4 Zaquieu, Ana Paula V. Os desafios da alteridade:considerações sobre gênero e sexualidade entre militantes de uma ONG/Aids carioca. Mar 2006, vol.13, no.1 Marques, Maria Cristina da Costa. Contradições e assimetrias na construção do conhecimento em Aids/HIV. Ago 2005, vol.12 Góis, João Bôsco Hora. Novas reflexões sobre a Aids?. Ago 2005, vol.12, no.2 Moutinho, Laura. Tal Brasil, qual prevenção?. Ago 2004, vol.11, no.2 Monteiro, Simone. Uma visão histórica sobre uma epidemia contemporâneaa Aids e o caso peruano. Dez 2003, vol.10, no.3 Góis, João Bôsco Hora. Reabrindo a ‘caixa-preta’rupturas e continuidades no discurso sobre Aids nos Estados Unidos (1987-98). Dez 2002, vol.9, no.3 Marques, Maria Cristina da Costa. Saúde e podera emergência política da Aids/HIV no Brasil. 2002, vol.9 Xavier, Caco. Aids é coisa séria! – humor e saúdeanálise dos cartuns inscritos na I Bienal Internacional de Humor, 1997. Jun 2001, vol.8, no.1 Ayres, José Ricardo de Carvalho Mesquita. Ruína e reconstruçãoAIDS e drogas injetáveis na cena contemporânea. Nov 1996, vol.3, no.3 Ferreira, Andréa Rocha. Quebrando o silênciomulheres e AIDS no Brasil. Out 1996, vol.3, no.2 Bastos, Cristiana. As ciências da Aids e a Aids das ciências:o discurso médico e a construção da Aids. Out 1995, vol.2, no.2  Camargo Jr., Kenneth R. de. Aids e a Aids das ciências. Out 1994, vol.1, no.1 Artigos em francês e espanhol: Spesny, Sara Leon. Les politiques du corps: l’approche critique de Didier Fassin à l’épidemie du Sida en Afrique du Sud. Dic 2014, vol.21, no.4  Torres-Ruiz, Antonio. Nuevos retos y oportunidades en un mundo globalizadoanálisis político de la respuesta al VIH/Sida en México. Set 2006, vol.13, no.3 Cueto, Marcos. El rastro del SIDA en el Perú. 2002, vol.9 Löwy, Ilana. Les métaphores de l’immunologieguerre et paix. June 1996, vol.3, no.1